INTRODUÇÃO
Viajar de automóvel pelas estradas do nosso país pode ser uma experiência agradável, mas também gera preocupações quanto à segurança. Um dos momentos mais vulneráveis ocorre durante as paradas nos pedágios. Mas você sabe qual é a responsabilidade das concessionárias que administram essas rodovias? E o que acontece em caso de roubo em um pedágio? Vamos explorar esse tema no texto abaixo.
O QUE DIZ A LEI
Para compreender a responsabilidade das concessionárias, é necessário conhecer um pouco sobre a legislação. O Código de Defesa do Consumidor (CDC) protege nossos direitos ao utilizarmos serviços públicos, como as rodovias. Segundo o CDC, as concessionárias de serviços públicos, ou seja, aquelas que administram as rodovias, possuem responsabilidade objetiva em caso de prestação de serviço defeituosa ou insuficiente. Em termos mais simples, elas são responsáveis por danos sofridos pelo usuário no trecho administrado, independentemente de culpa. A Constituição Federal reforça essa disposição no artigo 37, §6º, que trata da responsabilidade dos serviços públicos em geral.
CONSTITUIÇÃO FEDERAL:
Art. 37 (…)
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
O CDC também trata da matéria nos artigos 6º, 14 e 22:
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
(…)
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou por suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.
COMO PENSA A DOUTRINA?
Os estudiosos do direito, denominados doutrinadores, explicam que a responsabilidade objetiva é aplicada às concessionárias para garantir que elas cuidem adequadamente das rodovias.
O autor Sérgio Cavalieri Filho, por exemplo, afirma que não há necessidade de comprovação de culpa do fornecedor de serviço em casos de responsabilidade objetiva:
“A responsabilidade civil objetiva do Estado está fundamentada no risco administrativo, onde basta a comprovação do dano e do nexo causal entre a ação ou omissão do agente público e o prejuízo sofrido pelo particular, independentemente de culpa.”
Essa questão é simples de entender: a Constituição Federal estabelece uma série de serviços que o Estado deve prestar ao cidadão, indicando qual entidade pública irá realizá-los, podendo alguns serviços ser delegados a entidades privadas. Em caso de dano sofrido pelo usuário em decorrência da utilização de tal serviço, na busca judicial da reparação, não há necessidade de comprovar que a entidade pública agiu com negligência, imperícia ou imprudência. No entanto, é necessário que o dano esteja relacionado ao âmbito do serviço prestado pela entidade (ou seja, esteja dentro dos limites de risco assumido por ela).
Responsabilidade civil, portanto, nesse contexto, significa que alguém deve compensar outra pessoa por um dano sofrido. No caso das concessionárias, elas devem garantir a segurança dos usuários, o que implica manter as estradas em bom estado e oferecer um ambiente seguro, especialmente em locais onde os motoristas precisam parar, como nos pedágios, sendo responsabilizadas por danos ocorridos.
Mas o que acontece se um usuário sofrer algum dano, em uma rodovia administrada por uma concessionária, que não esteja diretamente relacionado ao serviço de manutenção e conservação das estradas? Vamos explicar isso com um exemplo prático.
CASO PRÁTICO
Imagine que uma família está viajando e, ao parar no pedágio, é abordada por dois homens armados que roubam todos os seus pertences. Note que o serviço de segurança contra roubos não está relacionado ao serviço prestado por uma concessionária de rodovia.
Nesse caso, a família terá direito a indenização? a resposta é NÃO!
Embora o roubo tenha ocorrido porque a família foi obrigada a parar na estrada, o judiciário entende que essa subtração foi causada por “fato praticado exclusivamente por terceiro”, caracterizando o chamado “fortuito externo”, o que EXCLUI o nexo de causalidade (ligação entre o ato da concessionária e o dano) e a consequente responsabilidade civil.
VEJA O TRECHO DA DECISÃO DO STJ (Superior Tribunal de Justiça):
A concessionária de rodovia não deve ser responsabilizada por roubo com emprego de arma de fogo cometido contra seus usuários em posto de pedágio.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.872.260-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 04/10/2022 (Info 752).
É importante destacar que nem sempre o “fato de terceiro” excluirá a responsabilidade das prestadoras de serviço público, mas apenas quando o evento for completamente estranho à atividade desenvolvida pelo fornecedor do serviço, conforme exemplo acima. Por outro lado, se esse fato estiver relacionado ao serviço da empresa, não há o rompimento do nexo de causalidade, pois ocorre o chamado “fortuito interno”. Exemplo: um caminhão deixa um objeto na pista, causando um acidente com um veículo que colide com o objeto.
Há responsabilidade também, por exemplo, em acidentes causados por animais na pista; atropelamentos de pedestres que atravessam a rodovia; buracos na estrada etc.
Há um caso absolutamente excepcional em que o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a responsabilidade de uma concessionária por furto ocorrido na estrada, mas isso será o tema de outro artigo.
O QUE FAZER EM CASO DE SINISTRO?
Mesmo com a responsabilidade das concessionárias, é essencial tomar algumas precauções para se proteger. Aqui estão algumas dicas:
– Evite viajar à noite, quando a visibilidade é menor. Procure utilizar a cobrança automática, sem a necessidade de parar nos pedágios.
– Mantenha as portas do carro trancadas e os vidros fechados ao se aproximar do local.
– Se perceber algo suspeito, não hesite em ligar para a polícia ou para o número de emergência da concessionária.
– Fique atento ao ambiente ao seu redor e evite distrações enquanto estiver parado.
CONCLUSÃO
Como vimos, apesar de não haver responsabilidade por roubo em parada de pedágio, a concessionária responde por diversos danos que possam ocorrer na rodovia administrada. Para garantir a segurança nas estradas, é essencial que as concessionárias cumpram suas obrigações. Elas devem investir em sistemas de segurança, como câmeras e iluminação adequada, especialmente nos pedágios. Além disso, é importante que haja policiamento e medidas de prevenção de crimes. Assim, todos nós podemos viajar com mais tranquilidade e segurança.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Se você tiver qualquer problema de segurança na estrada, procure um advogado de confiança para orientações mais detalhadas. Conhecer seus direitos é o primeiro passo para se proteger e exigir melhorias nos serviços públicos. A segurança nas estradas é uma responsabilidade de todos, e juntos podemos fazer a diferença.
Compartilhe este artigo para que mais pessoas estejam informadas sobre seus direitos nas estradas.
Em outro artigo escrevemos sobre a fulga do local do acidente. Para saber mais, clique aqui.
PERGUNTAS FREQUENTES:
A concessionária de rodovias pode ser responsabilizada por roubos que ocorrem nos pedágios?
Não. Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a concessionária não pode ser responsabilizada por roubos cometidos em pedágios, por ser considerado um “fortuito externo”, ou seja, um evento causado por terceiros e que não tem relação direta com o serviço prestado pela concessionária.
O que é “fortuito externo” e como ele afeta a responsabilidade das concessionárias?
“Fortuito externo” refere-se a eventos imprevisíveis e inevitáveis, provocados por terceiros, que não estão ligados à atividade da concessionária. Quando ocorre um fortuito externo, como um roubo em um pedágio, o nexo de causalidade entre o serviço da concessionária e o dano sofrido é rompido, excluindo assim a sua responsabilidade.
Em quais situações a concessionária pode ser responsabilizada por danos ocorridos na rodovia?
A concessionária pode ser responsabilizada em casos onde há falhas no serviço prestado, como em acidentes causados por buracos na pista, falta de sinalização, objetos deixados na rodovia, atropelamentos de pedestres e acidentes envolvendo animais na estrada. Nessas situações, o evento é considerado “fortuito interno”, ou seja, ligado diretamente à atividade da concessionária.
Se eu sofrer um acidente devido a buracos na pista, posso processar a concessionária?
Sim. Nesse caso, a concessionária pode ser responsabilizada por não manter a rodovia em condições adequadas, o que caracteriza uma prestação de serviço defeituosa. O consumidor tem o direito de buscar reparação pelos danos sofridos.
REFERÊNCIAS
– Código de Defesa do Consumidor (CDC) e a Constituição Federal, especificamente o artigo 37, §6º.
– CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 286.
– Julgado dos Tribunais Superiores.