OS PAIS E TUTORES PODEM SER PENALIZADOS POR FALTA DE FREQUÊNCIA ESCOLAR DOS FILHOS E TUTELADOS?

INTRODUÇÃO

A educação é como uma base sólida de uma casa: sem ela, tudo o que construímos pode desmoronar. Este artigo aborda a importância da frequência escolar e como os pais e tutores podem ser responsabilizados quando as crianças não vão à escola. Entender seus direitos e deveres é essencial para garantir que nossos jovens tenham um futuro brilhante.

DESENVOLVIMENTO DO TEMA

Como é de conhecimento geral, os direitos da Criança e do Adolescente são protegidos pela lei 8.069/1990 (ECA), além de outras normas. Um dos principais pontos é garantir que todos os menores frequentem a escola regularmente. O ECA, em definição absolutamente simples, é como um manual que explica o que os adultos devem fazer para proteger e educar os menores. Quando falamos sobre frequência escolar, estamos falando sobre garantir que as crianças vão à escola todos os dias, aprendendo e crescendo.

Primeiro, é importante entender por que a frequência escolar é tão crucial. Imagine tentar aprender a andar de bicicleta, mas você só pratica uma vez por mês. Assim como andar de bicicleta, a educação precisa de prática constante. Ir à escola todos os dias ajuda as crianças a aprender de forma contínua, além de   socializar e a desenvolver habilidades importantes para a vida.

Os pais e tutores têm a responsabilidade legal de garantir que as crianças frequentem a escola. O ECA, no Art. 55, diz que “os pais ou responsáveis têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino“. Isso significa que é dever dos adultos cuidar para que as crianças estejam matriculadas e frequentem as aulas regularmente.

PENALIDADES ADMINISTRATIVAS

Se os pais ou tutores não cumprirem essa obrigação, eles podem enfrentar penalidades administrativas. O ECA prevê algumas penalidades, como multas e advertências. A título de exemplo, veja o que diz o Art. 249 do ECA:  

Art. 249. Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao poder familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar: 

Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.

O processo para aplicar essas penalidades geralmente começa com uma notificação. As autoridades, como o Conselho Tutelar, verificam se a criança está faltando à escola. Se estiver, os pais ou tutores são chamados para explicar a situação. Se não houver justificativa aceitável, podem receber a pena de multa mencionada no artigo.

Porém, a aplicação dessa penalidade necessita de uma “Apuração de Infração Administrativa”. Mas é interessante notar que, apesar da lei falar em Apuração “administrativa”, esse procedimento é conduzido pelo Juiz da Vara da Infância e Juventude, conforme menciona o artigo 194 do ECA, após iniciativa do Ministério Público, Conselho Tutelar, Servidor ou Voluntário Credenciado:

Art. 194. O procedimento para imposição de penalidade administrativa por infração às normas de proteção à criança e ao adolescente terá início por representação do Ministério Público, ou do Conselho Tutelar, ou auto de infração elaborado por servidor efetivo ou voluntário credenciado, e assinado por duas testemunhas, se possível.

O procedimento é como qualquer processo judicial: há um pedido inicial; a defesa apresentada pelos pais ou responsáveis; e, se necessário, uma audiência de instrução e julgamento (como se fosse uma reunião com o Juiz e o Ministério Público), onde todos serão ouvidos.

Perceba que, caso seja provado a existência de negligência dos pais ou responsáveis no procedimento mencionado, o juiz irá sim aplicar uma penalidade de multa como forma de penalidade aos responsáveis. Sendo essa multa fixada em um patamar mínimo de três salários-mínimos.

Entendido isso, e em análise a situação de precariedade financeira de diversas famílias no Brasil, talvez, surja uma dúvida na cabeça do leitor: e se os pais da criança ou adolescente não tiverem condições de pagar a multa, é possível a sua extinção ou perdão? Para responder isso, vou explicar com um caso prático.

CASO PRÁTICO

Imagina que um adolescente de 14 anos deixou de frequentar a escola por negligência de seu pai. Tomando conhecimento disso, o Ministério público ingressa com uma “representação civil por infração administrativa” afirmando que ele (o pai) praticou a conduta descrita no art. 249 do ECA, pedindo a sua condenação.

Acontece que foi constatado que o pai vive sozinho com a criança (a mãe faleceu), sendo que o genitor é a única fonte de subsistência do menor. Além disso, ficou provado no processo que a família vive em condição precária, passando diversas necessidades.

Nesse caso, seria possível o afastamento da multa? A resposta é NÃO. Isso segundo o entendimento do nosso Superior Tribunal de Justiça:

Não é admissível que se exclua a sanção aos pais apenas ao fundamento de hipossuficiência financeira ou vulnerabilidade econômica.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.780.008/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/08/2022 (Info 746).

Apesar de parecer um pouco contraditório o objetivo da sanção, entende o STJ que a infração do art. 249, além de um cunho essencialmente sancionatório, possui também caráter preventivo, coercitivo e disciplinador. A intensão é que tais condutas não mais se repitam, a bem dos filhos.

Nesse caso você, leitor, pode estar se perguntando: “mas nem diminuição da multa pode ocorrer?”. A resposta para essa pergunta é um glorioso SIM! O mesmo tribunal que não admite a extinção da pena diz que a situação de hipossuficiência econômica dos responsáveis deve ser considerada como relevante para a fixação do valor da multa:

É admissível a redução do valor da multa do art. 249 do Estatuto da Criança e do Adolescente, inclusive aquém do mínimo legal de três salários-mínimos.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.995.403/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/08/2022 (Info 746).

Em caso semelhante ao citado, o STJ decidiu pela aplicação da multa no valor de 1 salário-mínimo. É importante lembrar que esse valor será revertido em favor de um fundo gerido pelo Conselho dos Direitos da Criança do Adolescente do respectivo município (art. 214 do ECA).

CONSEQUÊNCIAS DO NÃO CUMPRIMENTO

As consequências de não garantir a frequência escolar vão além das penalidades. A falta de educação pode limitar as oportunidades futuras das crianças, afetando seu desenvolvimento pessoal e profissional. O Conselho Tutelar e o Ministério Público podem intervir, conforme o Art. 136 do ECA, para garantir que a criança volte a frequentar a escola. Eles podem adotar medidas de proteção, como encaminhar os pais a programas de apoio e orientação.

Além das consequências já mencionadas acima, a manutenção da família como beneficiária no Programa Bolsa Família dependerá da frequência mínima conforme artigo 10, inciso IV da Lei 14.601 de 2023.

Frequência mínima de :

a) 60% (sessenta por cento), para os beneficiários de 4 (quatro) anos a 6 (seis) anos de idade incompletos; e

b) 75% (setenta e cinco por cento), para os beneficiários de 6 (seis) anos a 18 (dezoito) anos de idade incompletos que não tenham concluído a educação básica.

Ou seja, caso a criança não mantenha a frequência mínima na escola, o benefício ofertado pelo Governo Federal poderá ser suspenso.

DESAFIOS E MELHORIAS

O Conselho Tutelar enfrenta muitos desafios na fiscalização da frequência escolar. Às vezes, a falta de recursos e o número elevado de casos dificultam o trabalho. Melhorias podem incluir mais investimento em programas de apoio às famílias e campanhas de conscientização sobre a importância da educação. Os pais e tutores precisam entender que garantir a educação das crianças é um investimento no futuro delas.

 CONCLUSÃO

A frequência escolar é essencial para o desenvolvimento das crianças. Os pais e tutores têm um papel fundamental nesse processo e devem estar cientes de suas responsabilidades legais. As penalidades previstas no ECA são uma forma de assegurar que todos os menores tenham acesso à educação, não podendo ser afastada por conta exclusiva da hipossuficiência financeira dos responsáveis, mas pode haver diminuição do valor da multa.

Para dúvidas e questões mais detalhadas, é sempre importante consultar um advogado de confiança. Assim, garantimos que todas as crianças recebam a educação que merecem e possam construir um futuro melhor.

REFERÊNCIAS

– Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. E julgados do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

– Art. 136 do ECA: “Compete ao Conselho Tutelar zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente definidos nesta Lei.

 

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